A quem arde o rabo água se deita

Aquela menina nua do cadeiral da sé do Funchal parece condenada a gerar equívocos. O caríssimo Ralf lincou o post e fala em actos de sodomia e quem sou eu para duvidar disso.
Mísula de sala de recepção da Câmara de Damme. Séc. XV- cena de banho misto, observada por um louco Na verdade, como contei, é a mesma ideia que provoca aos sacristães madeirenses. Só que, para sermos mais exigentes, o subtexto que a suporta não era directamente esse.
Com efeito, a representação medieval de actos de higiene é que estava associada ao pecado da voluptuosidade e da soberba. Várias são as fontes que o sustentam, desde os banhos de Betsabé- mesmo debaixo do nariz de David, até aos cabelos soltos das filhas de Sião, fustigadas como luxuriosas por Isaías- apenas no que se refere a fontes religiosas.
gravura do século XVII-
Nas profanas, o tema é glosado com variantes que vão da simbologias das águas das regras das sereias e da Melusine, às lâmias bascas, senhoras das águas, na tradição da Catalunha ou os ritos das lavadeiras, de que já falámos a propósito das rosas das ursas.

Na tragicomédia La Celestina, Fernando Rojas leva ao extremo este sentido lúbrico, quando caracteriza a alcoviteira: « Ella ténia seus ofícios, conviene saber: lavadera, perfumera, maestra de hacer afeites y de hacer virgos, alcahueta y un poquito hechícera. Era el primer oficio cobertura de los otros, so color del cual muchas mozas destas servientas entraban en su casa a lavar-se »

Brueghel,7 pecados mortais, soberba, 1556 (det.)Sem rodeios, Brueghel representou este acto de lavagem de cabelos femininos a par do homem a fazer a barba, numa das suas satíricas alegorias aos pecados mortais- neste caso, ilustrando a soberba.

Mas, para que não se pense que se preferiam tristezas a folias, naqueles tempos tão contrastados, voltaremos ao assunto.

Até já

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Ver: Isabel MATEO GÓMEZ, Temas profanos en la escultura gótica espagñola. Las sillerias de coro, Madrid, Instituto Diego Velazquez, 1979)

4 comments on “A quem arde o rabo água se deita”

  1. zazie says:

    1- Ninguém aqui escreveu que na Idade Média havia hábitos de higiene

    2- Os beija-cus e rituais de cagots, templários, e maçónicos existiram.

    Não há nenhuma mentira nisso. Eu fiz post com iconografia que não foi inventada. Foi réplica dos rituais que se faziam.
    E também não invalida que tenham sido extintos por motivos de interesses da coroa.

    Quem quiser pode negar isto à vontade. Mas só nega da boca para fora, porque tem qualquer crença que lhe impede o conhecimento.

    Não é o meu caso. O Cocanha é exemplo que não há crença que me impeça de brincar com tudo. Em particular com aquilo que muito respeito.

    Por aqui não há mistura entre informação histórica e agit prop. Ou, pelo menos, tenta-se que não haja.

    Apenas rectifiquei o que disseste. Desconheço em absoluto perseguições a judeus por tomarem banho.

    E os banhos públicos eram e continuaram a ser antros de prostituição. Até tenho aqui um regulamento de Paris do século XIII, caso estejas interessado.

  2. Não concordo que na Idade Média houvesses hábitos de higiene.A lepra a que é que era devida?
    E o filho de D. João II, que eu saiba, morreu da queda de um cavalo.A tradição dos beija-cus, repito, foi uma calúnia contra os Templários levantada pelos facínoras Filipe o Belo e Clemente V.

  3. zazie says:

    Isso é treta, rapaz. Os banhos públicos eram comuns por todo o lado. O que acontecia era serem usados para a prostituição.
    Quanto aos judeus, bem pelo contrário. Só as elites é que tinham alguma liberdade porque eram eles próprios quem impunham lei sobre os seus. Em alguns países do Norte da Europa e do Leste as judiarias nem luz do sol podiam ter.
    Quanto aos mouros sim, tinham a tradição dos banhos mas ninguém impedia nada. Então e os banhos das rainhas e princesas que iam para as termas? Havia coisa mais usada que os banhos termais? E os monarcas na banhoca nos rios? Como é que morreu o filho do D. João II?

    Tu andas a ler coisas de bruxaria, cá prá mim. Olha, lê o Dubby que esse sim tem boas fontes.
    E por cá não havia animosidade alguma contra mouros e mesmo contra judeus foi coisa esporádica e tardia pelos motivos que se sabe.
    Havia sim um socieadade em que cada um tinha o seu lugar e as estratificações não permitiam tratamementos igualitários. E é claro que eram tempos de grande violência e escravatura. Mas em nada disso entram pactos com demo por causa do banho. Por causa de outro tipo de ritos, sim. Mas esses é que nada tinham de cor-de-rosa.
    Já fiz aqui um post sobre o assunto e aí tu é que negaste. A tradição dos beija-cus.
    Quanto aos judeus de elite eram odiados por causa da usura. Eram eles os cobradores de impostos da coroa e ganhavam com a percentagem que cobravam. Uma parte era para eles. E dessa parte é que o povo se queixava que era abuso e roubo.

  4. Tenho uma obra, LA POLLUTION AU MOYEN ÂGE, de Jea-Pierre Leguay, que nos relatas as condições de vida assustadoras em termos de poluição e higiene na Idade Média. Recordo que vem daí uma das razões da animosidade de cristãos contra judeus e muçulmanos: a prática das abluções que lhes permitia uma vida mais longa e mais saudável que a dos cristãos resultava numa desconfianta de pacto com o diabo.
    Gostava que visitasses o odisseus e comentasses o meu último texto. Beijos

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