encerrado numa torre de marfim

Este personagem não escrevia eféméridos em letra miudinha, mas também se entregou com frenesim a uma escrita críptica, fazendo sair das suas mãos belíssimas torres imaginárias.
Mais próximo da história do Spider do Cronenberg que do escritor compulsivo da Avenida Fernão de Magalhães, Achilles G. Rizzoli (1896-1981) era filho de emigrantes pobres, de origem Suiça e Italiana, que se instalaram na Califórina.
Teve formação em engenharia mas o fascínio pela arquitectura começou a atormentá-lo muito cedo.
A família sofre uma série de atribulações que incluíram o desaparecimento do pai depois de ter roubado uma arma no trabalho. São obrigados a mudarem-se para uma casa modesta em S. Francisco, onde Rizzoli leva uma perturbada vida de celibatário, vivendo sozinho com a mãe e partilhando toda a vida a cama com ela até esta morrer.

Durante anos vive de trabalhos miseravelmente pagos para expiar a culpa do pai, até que decide ser escritor e publicar uma enfastiante novela sobre arquitectura que não teve leitores.
Apesar do falhanço literário a imaginação de Rizzoli não esmorece. A fixação por arquitecturas aumenta e Rizoli passa a entregar-se ao desenho de projectos visionários que simbolizavam as metamorfoses que parentes e vizinhos teriam depois de mortos.
Depois do suicídio do pai, Rizzoli isola-se e as alucinações arquitectónicas entram no desregramento.
Um dia, depois de espreitar os genitais de uma menina sua vizinha, escreve “Parem tudo! Tal como o coração palpita embaraçado, tentando desesperadamente escapar… pela estreita passagem conhecida por garganta…perante o pensamento que aos 40 anos alguém tenha tido finalmente um vislumbre da veeaye”.
E assim se iniciaram os projectos das torres fálicas da Veeaye, acompanhados de escrita críptica poética, pretendendo conjugar princípios arquitectónicos com a sacralidade da virgindade feminina. As torres, de aspecto gótico, eram decoradas no topo com os órgãos sexuais masculinos e femininos, incluindo na “Bluesea House” a fórmula para se atingir o orgasmo.

A utopia arquitectónica fechava com o sinal YTTE (Yield To Total Elation) e a total eleição não se fez esperar…
Incluía 80 desenhos, como “O Caminho Fálico”, o “Palácio do Relaxamento”, o “Templo dos Sonhos”, todo ele dedicado à poesia e ao prazer, ainda que certas siglas fossem um tanto inquietantes. A Acme Sitting Station,- A.S.S.- era o nome dado à casa de banho e para quem desejasse abanar o seu mortal alambique havia “ O Poço da Ascensão” onde tinha à disposição uma agradável e indolor eutanásia.

Ao longo do restantes anos da vida continuou a trabalhar numa fantástica terceira Bíblia arquitectónica a que chamou A.M.T.E,- Celestial Extravaganza – inspirado pela Miss Architecture Made To Entertain- uma espécie de esposa virgem de Cristo.
Em 1977 o infeliz visionário sofre um acidente que o deixa inválido, acabando por morrer em 81.
A obra tinha-se perdido se não fosse o acaso de uma mulher se ter lembrado em 1990 de mostrar os geniais desenhos a um galerista.
A partir daí dá-se a descoberta deste esquizofrénico artista californiano, cujo espólio é incluído no American Folk Art Museum .
Em 1997 estes nconfessáveis sonhos de pedra foram publicados no livro A. G. Rizzoli: Architect of Magnificent Visions

6 comments on “encerrado numa torre de marfim”

  1. C. says:

    força zazie 😉

  2. zazie says:

    RMA, Quando li o post da Cris lembrei-me logo deste Rizzoli…
    há loucuras incríveis. Outro que também andava com vontade de postar é o Richard Dadd

    bjs

  3. cbs says:

    Magnífico!
    é a palavra.
    Não que a estética me entusiame, mas um doido assim merecia mais sorte em vida.

  4. Ahab says:

    Que post magnifico, zazie! Desconhecia completamente a existencia deste Rizooli.

    E tens razão num ponto: a vida deste homem tem muito em comum com o “Spider” do Cronenberg.

  5. Bom, agora, para ser coerente com a parte da vida posterior à grande revelação, há que passar do papel à pedra…

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