do uso do riso

(…) dirigiam-se frequentemente a ele lendo-lhe textos de difícil compreensão, consultando-o para um escólio ou pedindo-lhe luzes sobre o modo de representar um animal ou um santo. E ele olhava para o vácuo com os seus olhos extintos como se fixasse páginas que tinha vívidas na memória, e respondia que os falsos profetas estão vestidos como bispos e que da sua boca saem rãs, ou quais eram as pedras que deviam adornar os muros de Jerusálem celeste, ou que os arimaspos devem ser representados nos mapas junto da terra do Prestes João — recomendando que não exagerassem ao torná-los sedutores na sua monstruosidade, que bastava que fossem representados de modo emblemático, reconhecíveis mas não concupiscíveis ou repelentes até ao riso.

E no entanto fizeram-se. E tornaram-se enigmas que estimulavam a arte da memória. Só não se sabe se eram motivo de riso…

Mas foi também por via do riso que mais tarde se captou o sentido trágico e absurdo da existência.

(e é mesmo acerca disso que está post na calha)

[imagem- mnemónica do Evangelho de S. Marcos, Ars Memorandi (ed. 1502) ]

↓