a propósito de bruxas e íncubos
1-
Uma donzela dos arredores de Nantes tinha um amante a meia légua da sua aldeia. Tinham levado tão longe os encontros, os suspiros e as declarações de amor, que a sua virtude acabou por ceder; e como nestes casos o que custa é só o primeiro passo, anteciparam-se ao casamento, sempre que tiveram ocasião.
Um sábado (foi véspera de S. João), a jovem dirigiu-se um pouco antes da noite a um sítio escuso num bosque onde o amante a deveria esperar. Como ele ainda não tinha chegado, ela começou a lamentar os favores que lhe havia concedido, dando-lhe assim o direito de faltar ao cumprimento das atenções devidas; depois, compensando a falta de respeito pelos prazeres que o seu amante lhe proporcionava, decidiu esperá-lo, temendo aborrecê-lo se faltasse ao encontro; e ao menos para ter o prazer de lhe ralhar.
Todavia, ele continuava a não vir; uma hora de impaciência passou-se a noite começava já a espalhar a sua obscuridade. A jovem fica furiosa e começa a proferir imprecações contra o seu amante, mandando-o para o diabo e dizendo entre dentes que mais valia ter arranjado um demónio que um amante tão pouco fervoroso e que, assim que tivesse ocasião, não teria o menor escrúpulo em lhe ser infiel. Mal pronunciara estas palavras quando vê aproximar-se o dito amante. Preparava-se para lhe dirigir as maiores injúrias, mas ele desculpou-se o melhor que pôde, dizendo que havia sido retido por importantes ocupações, mas que a amava mais do que nunca. A cólera da jovem abrandou. Ele pediu-lhe perdão e ela concedeu-lho; e imediatamente ficaram de acordo. Dirigiram-se para o bosque a fim de se entregarem às volúpias do amor, a noite favorecendo os seus misteriosos prazeres.
Mas, passado pouco tempo, ao julgar entrelaçar o amante nos seus braços a jovem sentiu um corpo peludo, com uma longa cauda que se agitava no ar. “Oh! Meu amigo…” exclamou ela. “Não sou o teu amigo”, respondeu o monstro enterrando as garras nos ombros da camponesa, “ sou o diabo que ainda há pouco evocaste”. Dizendo estas palavras, assoprou-lhe no rosto e desapareceu. A infeliz regressou febril e desvairada à sua aldeia, onde ninguém queria reconhecê-la de tal modo estava desfigurada. Deu à luz um gato preto ao cabo de sete dias e ficou doente para toda a vida.
Uma donzela dos arredores de Nantes tinha um amante a meia légua da sua aldeia. Tinham levado tão longe os encontros, os suspiros e as declarações de amor, que a sua virtude acabou por ceder; e como nestes casos o que custa é só o primeiro passo, anteciparam-se ao casamento, sempre que tiveram ocasião.
Um sábado (foi véspera de S. João), a jovem dirigiu-se um pouco antes da noite a um sítio escuso num bosque onde o amante a deveria esperar. Como ele ainda não tinha chegado, ela começou a lamentar os favores que lhe havia concedido, dando-lhe assim o direito de faltar ao cumprimento das atenções devidas; depois, compensando a falta de respeito pelos prazeres que o seu amante lhe proporcionava, decidiu esperá-lo, temendo aborrecê-lo se faltasse ao encontro; e ao menos para ter o prazer de lhe ralhar.
Todavia, ele continuava a não vir; uma hora de impaciência passou-se a noite começava já a espalhar a sua obscuridade. A jovem fica furiosa e começa a proferir imprecações contra o seu amante, mandando-o para o diabo e dizendo entre dentes que mais valia ter arranjado um demónio que um amante tão pouco fervoroso e que, assim que tivesse ocasião, não teria o menor escrúpulo em lhe ser infiel. Mal pronunciara estas palavras quando vê aproximar-se o dito amante. Preparava-se para lhe dirigir as maiores injúrias, mas ele desculpou-se o melhor que pôde, dizendo que havia sido retido por importantes ocupações, mas que a amava mais do que nunca. A cólera da jovem abrandou. Ele pediu-lhe perdão e ela concedeu-lho; e imediatamente ficaram de acordo. Dirigiram-se para o bosque a fim de se entregarem às volúpias do amor, a noite favorecendo os seus misteriosos prazeres.
Mas, passado pouco tempo, ao julgar entrelaçar o amante nos seus braços a jovem sentiu um corpo peludo, com uma longa cauda que se agitava no ar. “Oh! Meu amigo…” exclamou ela. “Não sou o teu amigo”, respondeu o monstro enterrando as garras nos ombros da camponesa, “ sou o diabo que ainda há pouco evocaste”. Dizendo estas palavras, assoprou-lhe no rosto e desapareceu. A infeliz regressou febril e desvairada à sua aldeia, onde ninguém queria reconhecê-la de tal modo estava desfigurada. Deu à luz um gato preto ao cabo de sete dias e ficou doente para toda a vida.
Collin de Plancy, Dicionário Infernal (1826)
2- tentações pecaminosas numa vocação religiosa perdida
Fuseli, The Nightmare, 1871
3- tentações incestuosas numa família rural
David Lynch, Quem matou Laura Palmer
24 comments on “a propósito de bruxas e íncubos”
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pois zazzie…ou isso e tal e coisa…
🙂
mas a opinião é da minha avó…
ora muito obrigada pelo Gallo. Só podia vir de uma avó zundapp uma escolha dessas!
cá para mim tenho de alterar o concurso e dizer é que é de gajos com pinta e mainada! o Vincent Gallo para o meu gostinho ganhava já o primeiro lugar mas era na categoria de gajos giros e com super-pinta “:O)))
eu tamém acho o dc doutra cepa (principalmente no irmãos inseparaveis)…quanto ao post abaixo a minha avó maria pandemia diz que o vincent gallo é feio, mas parece que tem pinta e coisa e tal…fica o voto dela.
então dorme bem e eu fico toda contente de uma pessoa que nem gosta de imagens gostar do David Lynch “:O)))
repara, de modo algum quis dizer que a qualidade artística do lynch fosse o resultado de algum problema psiquiátrico (e mesmo que o fosse)
é irrelevante em dois sentidos: primeiro porque o facto de alguém não dar explicações psicanalíticas para uma criação artística não quer dizer que elas não existam (sem querer com isto significar que o autor é um psicopata obviamente) e, segundo, porque o conteúdo do lynch que apela imenso a um significado psicanalítico torna relevante por isso mesmo a qualidade das suas obras, isto é, elas apelam, de um modo extraordinariamente bem-feito diga-se de passagem, a um mesmo imaginário e a um mesmo background cultural e emocional, consciente e inconsciente, dos milhões de seres individuais que, como eu, se deleitam nele 🙂
estou cheio de sono
se puder amanhã faço um post sobre isto
sempre não. também se pode transforma-la em matéria de filme como é o caso do velho Godard de outras épocas
pois, eu também penso que é irrelevante do ponto de vista artístico. mas creio que é muito mais difícil chegar-se lá por meios apenas plásticos. Ter capacidade para os intuir directamente pelos sentidos (o Bacom dizia o mesmo a propósito da sua pintura- aquilo que entra directamente no sangue)
Mas não sei se estavas a pensar nisto ou se estavas a pensar na cabecinha dele.
Eu acho-o muito interessante porque até é um tipo “normal”. Nada problemático, com infância cor-de-rosa. Com família mais que elquilibrada. Todos os pesadelos do Lynch vêm da fantasia. Não encontras por lá nada mais que uma boa loucura normal. Muita excentriciade, muita fantasia, humor e enorme intuição pelo absurdo.
Às vezes dá vontade de o confrontar com o David Cronenberg. Mas neste enconras coisas muito mais complicadas. O que importa é conseguirem mostrar tudo pela linguagem mais simples- por mera linguagem cinematográfica. A teoria no cinema é sempre uma muleta.
“ele diz que não faz a menor ideia porque nunca leu nada de psicanálise e nem sequer se interessa por explicações racionais ou outras para as suas histórias”
é irrelevante
na pedra looooooooooollll
mas realmente nunca tinha pensado nisso… tu não tens uma única imagem no teu dazibao bíblico… tem piada.
E se tivesses de escolher entre a voz e a escrita o que preferias? um dazibao gravado?
estás a brincar! mas isso dizia o S. Bernardo com medo de desviar a ascese mísitica para a estética (ou vice-versa) porque também sabia que as coisas estavam ligadas…
mas nem te imaginava nada evangélico por isso acredito que seja mais coisa de talibã ehehe as imagens e o riso, ainda por cima…
“:O))))
zazie
levantas problemas bem complicados
para os quais a psicoterapia seria uma grande ajuda lol:)
digamos que compreendo os talibans
detesto visceralmente as imagens enquanto simbologia
mesmo quando gosto delas 🙂
só uma excepção. gosto de ver um filme de terror na televisão se estiver sozinha em casa e às tantas da noite “:O))))
olha, o que nunca consegui gostar foi de ver televisão. De tal modo que ter uma televisão ligada em casa durante o dia é uma coisa que até me causa indisposição. nem sei explicar. Então quando há gente que a liga mal acorda e fica para ali a olhar para o ecrã… é isso e ouvir logo música mal sai da cama.
São coisas estranhas que quase me causam repulsa física
se eu também fosse muito curiosa era capaz de ficar a matutar porque motivo pode haver quem não goste de cinema. O Dragão também não gosta mas já explicou o caso. Mas ainda assim deixa-me que pergunte: tu não gostas de cinema como muita gente que perfere o teatro ou não gostas de cinema ponto final. E gostas de imagens? de pintura, de desenho, por exemplo? ou só mesmo a arte espiritual que entra pelos ouvidos?
“:O)))))
Para mim até o facto de estar num sala de cinema ás escuras já é um prazer quanto mais o que se pode desenrolar na tela. Gosto de evasões da realidade. todas “;O)
Pois é timshel. Mas olha que já houve quem tentasse e o entrevistasse perguntando todos esses motivos e ele diz que não faz a menor ideia porque nunca leu nada de psicanálise e nem sequer se interessa por explicações racionais ou outras para as suas histórias. A única mania que ele tem de verdade é a tal cena da meditação transcendental. Acho que é mesmo apanhado por isso e a irmã até dá aulas.
Uma vez fiz-lhe essa pergunta no chat e ele disse-me o mesmo :”keep your eye on the donut and not on the hole.”
Ele pode chegar lá, a essas questões todas mas chega pelos sentidos, por formas plásticas e não encontras uma única chave para tudo.
Neste caso achei piada em confrontá-lo com o Fuseli que era um tipo estranhamente recalcado que tudo o que escreveu sobre arte é o oposto do que praticou. Incluindo este quadro com uma modelo por quem se diz que teve grande fixação mas que até era uma feminista. Acabou por casar com outra e a mulher tratou de meter esta a milhas. Ele costumava dizer que a pior coisa que pode haver é uma mulher bonita e inteligente “:O)))
zazie
eu não gosto de cinema (já repeti isto tantas vezes´que já deves saber)
mas o lynch e a laura palmer mereciam uma análise aprofundada com psicoterapia e tudo
ora bem, a menina é que me compreende. É claro que isto se resume sempre tudo a uma boa trincadela…
agora com poias de cavalo é que se dispensa, né?
mas os artistas são assim, só se lembram de inutilidades…
Uhh isso faz lembra a estória do Lobo Mau :))
(Então e o tipo feio e com pinta?!! Será aparentado com o Lobo Mau? :)))
é sempre tudo de olho vivo e dentuça bem afiada…
ups! cá para mim é tudo a mesma coisa. Onde é que já se viu piquenas entusiasmadas com gajos feios ou com cavalgaduras enquanto dormem…
na minha terra não há destas coisas..
AHAH,
Olha um Mussaranho Coxo :))
Como vai?
Eu não estava a referir ao tipo feio com pinta, referia-me mesmo às estórias de bruxas e quejandos!
Para o tipo ‘feio’ e com pinta já dei :))
ó menina, ó menina, olhe que o concurso dos gajos feios é no outro post.
Estas manias que a zazie em misturar os títulos todos é no que dá. E depois anda aqui um musaranho a orientar as “piquenas” por causa de gajos feios na tela…
palavra que me deviam pagar a peso de ouro para uma coisa destas…
Oh Zazie
Estas são estórias para aterrorizar criancinhas!!
Como aquela do papão: “se não comeres a sopa toda, vem aí o papão”!!
:))