mas tive o diabo na mão…

 

Uma mulher sentada, com ar virginal, tem preso pela trela um passaroco gigante,enquanto a seu lado se anicham dois animais- talvez leõezinhos.

A cena podia ser interpretada como uma alusão a S.ta Marta a domar a tarasca, mas há alguns detalhes que levantam outras suspeitas.

O bicharoco tem uma face humana com uma penca demasiado suspeita. A mesma com que se costumava representar o mocho-judeu, símbolo das trevas, dos que não acreditaram na luz que o Messias trouxe ao mundo.

Na tradição lendária, as crias leoninas nasciam mortas e eram ressuscitadas pelo bafo materno, simbolizando a redenção cristã.

Mais ao lado, um uroboros envolve no seu ciclo eterno outra figura velada e a simbologia completa-se: o espírito mariano- da Nova Lei redentora do Mundo- ganha fala nesta insólita iconografia de um capitel medievo, da igreja de Santa Maria do Castelo de Serpa.

[mocho-judeu, manuscrito iluminado- British Library, Harley MS 4751, Folio 47r]

8 comments on “mas tive o diabo na mão…”

  1. zazie says:

    o homem tem um fato com botões que me parece coisa de eclesiástico. Está a ser tentado pela serpente demoníaca mas ri-se que nem um doido. E tem um objecto na mão direita- em forma de cano. Parece-me um tinteiro. Fazia sentido porque também tem um bicharoco muito divertido junto à orelha.Deve estar a dizer-lhe cada uma…

    Outro que só tem coisas que o apoquentam…
    “:O))))

  2. zazie says:

    pois é….pois é….
    esta não tem vassoura mas também nunca percebi o motivo de levar a mãp ao peito. Pode ser num sentido sagrado. Mas, do lado direito nota-se que tem cabelos soltos…
    Os animais estão deitados e um olha para ela. Parecem-me leões. Quanto à tua tarasca, insisto: é pássaro. Tem penas. Tem duas patas. É um pássaro gigante agarrado pela coleira. Domou-o. É verdade que o demónio costuma ser domado com uma corda ao pescoço mas nunca com uma coleira. E é verdade que a Tarasca é que é passeada como um animal domesticado.
    Mas e a penca?
    só coisas que m’apoquentam…
    ahahahahaha

    beijoca

  3. Antónimo says:

    É pá, não consigo ver a cara de pessoa, só uma felina, leonina, com orelhinhas redondas espetadas. As asas, acho que sim, pode ser.

    Voltemos à figura feminina: e que dizes dos Arnolfini? Lá está uma figura feminina (tem sido identificada com Sta. Margarida (com relíquias em Bruges), mas também com Sta. Marta), no espaldar da cama: tem um dragão aos pés e uma vassourinha pendurada ao lado. Por baixo, tem, no braço do banco, uma figura monstruosa de atributos humanos (a Tarasca?) e, um pouco mais abaixo (na cama?) um leão. Mulher, monstro, dragão e leão.

    Faca ou tinteiro? Ainda não decidi (faca à esquerda?).

  4. Antónimo says:

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  5. zazie says:

    A ideia de Eva/Maria também me parece pertinente mas aquilo é um pássaro. Não há hipótese de ser dragão- tem é ar de tarasca, o que é habitual sempre que se representam estas figuras demoníacas. Más é pássaro das trevas e a associação ao demónio aprisionado pela mulher casta, ou pela Virgem, também é comum. Se é demo judcaico ou não, já é outra coisa. Eu encasquei que pode ser. Mas há mais passarocos por lá.

    Olha aqui o uroboros e vê lá se não tem asas também e cara de pessoa.

    E aqui um detalhe

    E espreita este outro passarão

    Esta aqui é que é mesmo uma serpente a tentar o tipo. O que é que achas que ele tem na mão? Uma faca ou um tinteiro?

  6. Antónimo says:

    Não consigo ver o rosto humano do uroboros…

  7. zazie says:

    Esta é apenas uma hipótese. Inicialmente até me pareceu uma alusão aos evangelhos apócrifos com o nascimento de Cristo acompanhado pelo demónio. Na Batalha há um. Mas o uroboros é mais complicado. Não é apenas uma serpente. Uma das extremidades também tem face humana e parece possuir um barrete cónico.

    Ou se trata de intervenções judaicas e, nesse caso, o uroboros era o próprio judaísmo a abraçar o mundo, ou então a ideia mariana impõe-se. Por outras razões: todos os capitéis tem referências à Virgem, aos anjos e a uma série de pássaros com máscaras humanas.

    O que não consigo identificar bem são os ditos animais (um até parece estar deitado em pose de esfinge) e a figura que está no interior do uroboros-

    Mas o passaroco tem 2 patas- faz toda a diferença do dragão- tarasca da Sta. Marta. E não te esqueças que a igreja do castelo é dedicada a Sta Maria

  8. Antónimo says:

    O mocho-judeu parece-me bem apanhado. Mas pões completamente de lado a Tarasca da Sta. Marta lendária? O “uroboros” não poderá ser outra figuração da Tarasca, também narrada como uma serpente?
    A figura feminina referir-se-ia, assim, não à Virgem, mas à Mulher, a mulher-Eva, a mulher-Marta (que implica a Virgem enquanto anúncio da Redenção). A mulher entre a serpente e o demónio. E teríamos uma aproximação a um imaginário que perdura em procissões do Corpus Christi.

    Como identificas a figura sobre a cabeça do uroboros?

    As marcas do escopro no fundo indiciam algum restauro recente?

    Muito curioso.

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